terça-feira, 24 de abril de 2012

SSP envia força-tarefa para mediar conflitos dos indios

Decisão foi tomada em reunião nesta segunda-feira (23).

Força-tarefa vai trabalhar junto com a Polícia Federal em área de conflito.


Reunião aconteceu na tarde desta segunda-feira (23)
(Foto: Divulgação)

A Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) anunciou na noite desta segunda-feira (23) a criação de uma força-tarefa para mediar os conflitos entre índios, fazendeiros e agricultores, nas cidades de Pau Brasil, Itaju do Colônia Camacan, no extremo sul da Bahia. A decisão foi anunciada pelo secretario de segurança do estado, Maurício Barbosa, em reunião feita com representantes do Ministério da Justiça, Força Nacional, Polícia Federal, Fundação Nacional do Índio (Funai), Polícias Rodoviária Federal, Militar e Civil.
Em nota, a SSP informa que durante a reunião foram definidos grupos que vão atuar em várias áreas de segurança, que trabalharão com a Polícia Federal no intuito de mediar os conflitos. “Estamos prontos para dar todo o apoio ao governo federal na defesa da população dessas cidades do sul, que estão sofrendo com a situação”, disse o secretário de segurança Maurício Barbosa.
Em nota a SSP afirma que a primeira ação da força-tarefa será desarmar os dois lados conflitantes e que "ações mais efetivas só serão tomadas após o julgamento da causa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que decidirá sobre a posse das fazendas disputadas."
Reunião sem acordo
A Polícia Federal reuniu fazendeiros e agricultores na sede do Sindicato dos Produtores Rurais da cidade de Pau Brasil, na manhã desta segunda-feira, e, por cerca de três horas, debateu com a comunidade rural proposta para encerrar a disputa de terras na região sul da Bahia, pelo menos até julgamento do caso pelo STF, ainda sem previsão de ocorrer. De acordo com Cleide Aguiar, secretária-geral do sindicato, o encontro foi marcado pela presença de cerca de 60 pessoas, que rejeitaram a manutenção da paz se os índios não desocuparem 12 fazendas localizadas nas imediações do rio Pardo.
A secretária-geral do sindicato afirma que as 68 fazendas invadidas na região sul são de pequeno e médio porte e produzem leite e gado de corte, em sua maioria. A contraproposta feita pelos agricultores deve ser encaminhada para análise à coordenação local da Funai.
A reunião foi mediada pela Polícia Federal em Ilhéus e pelo Comando de Operações Táticas (COT), que está na região com cerca de 30 homens da tropa especial desde a tarde de domingo (22).
No domingo (23), o delegado federal Rodrigo Reis comentou que há conhecimento de que cerca de 64 fazendas já foram tomadas pela população indígena, mas a Funai aponta 68. A série de ocupações por parte dos índios foi iniciada em janeiro deste ano, porém o conflito persiste na região há mais de 30 anos.
O cacique Nailton Muniz indicou que, durante as últimas décadas, 393 propriedades foram empossadas pelos índios em todo o estado, com atualmente mais de quatro mil pessoas residentes.
O delegado afirmou ainda que não há como relacionar, sem investigar, os crimes ocorridos nos dois últimos dias com a situação de disputas de terra que ocorre na região. No sábado (21), um homem foi encontrado morto dentro de uma fazenda com um tiro na nuca. Na sexta-feira (20), um índio foi pescar no rio em uma das fazendas ocupadas e foi atingido com um tiro na perna.
Caminhão incendiado em Pau Brasil (Foto: Imagem/TV Santa Cruz)Caminhão incendiado em Pau Brasil no sábado
(Foto: Imagem/TV Santa Cruz)
Caminhão incendiado
Um caminhão onde estavam trabalhadores rurais foi incendiado na manhã de sábado, também na cidade de Pau Brasil. Ninguém ficou ferido. Segundo testemunhas, vaqueiros que usavam o veículo para seguir até propriedades rurais e retirar cabeças de gado foram obrigados a fugir correndo antes do caminhão ser incendiado.
Na delegacia, eles contaram que foram abordados por homens encapuzados e armados. Os suspeitos não foram localizados. O homem que dirigia o carro relatou que os trabalhadores chegaram a sofrer agressões, como chutes, antes de conseguirem correr para fugir do grupo.
Disputa
Desde janeiro, os índios já invadiram 68 fazendas. Eles querem ocupar 54 mil hectares de terra, entre os municípios de Itaju do Colônia, Camacan e Pau Brasil. Em Itaju do Colônia, foram invadidas todas as fazendas que, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai) estão dentro da área que seria da reserva indígena. No total, são 57 fazendas ocupadas só no município. Segundo o sindicato dos produtores da região, mais de 500 trabalhadores rurais já foram demitidos nas propriedades tomadas pelos índios.
Garantia de território
Em nota à imprensa, a Funai informou que as ocupações são estratégicas para a garantia de posse do território tradicional do índio. "Frente à espera de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ação proposta ainda em 1982, os pataxó hã hã hãe passaram a ocupar, desde janeiro deste ano, áreas que se encontram no interior da terra indígena mas que ainda são exploradas por fazendeiros. A decisão é tomada pelas comunidades indígenas e embasada em seus laços culturais e afetivos com suas terras, enquanto não se efetiva a plena proteção territorial a que fazem jus".
A Funai aponta que os índios têm, constitucionalmente, garantida a proteção de terras no sentido de favorecer a qualidade de vida e os costumes da população. Também indica a recorrência de "graves" violações aos direitos humanos dos índigenas como a morte, segundo a Funai, por omissão de socorro, de José Reis Muniz de Andrade, em fevereiro deste ano. "A ocupação de áreas tem se mostrado como uma estratégia para grupos que se encontram impedidos de gozarem de seus direitos territoriais, especialmente em áreas em que há grave ameaça à qualidade de vida dos indígenas e do meio ambiente de suas terras. Por ordem constitucional, é garantida a proteção das terras indígenas com condições ambientais e sociais mínimas para a manutenção dos modos de vida desses povos, segundo seus usos, costumes e tradições", afirma a nota.
índio (Foto: Reprodução/TV Bahia)índios já ocuparam 68 fazendas no sul da Bahia
(Foto: Reprodução/TV Bahia)
Pedido de nulidade
Segundo o chefe da coordenação da Funai em Pau Brasil, Wilson Jesus de Souza, o objetivo dos índios não é a posse das terras, e sim, a nulidade dos títulos que garantem a posse aos fazendeiros. Ele afirma que, em abril de 1982, a Funai entrou com um pedido junto ao Supremo Tribunal Federal requerendo a nulidade dos títulos de terra que foram concedidos aos fazendeiros.
O representante da Funai explicou que os índios reivindicam 54.100 hectares, área que foi demarcada como território índigena entre 1937 e 1938. "Dez anos após a demarcação das terras, em 1948, o Serviço de Proteção ao Índio (STI), órgão que era vinculado ao Ministério da Agricultura, inicia um processo de arrendamento das terras para os fazendeiros. Nessa época os índios não tinham que aceitar ou não, eles simplesmente eram obrigados a se submeter a determinação do STI, porque o STI era quem coordenava, administrava e dava as ordens na terra”, afirma.
O coordenador da Funai conta que, na medida em que os fazendeiros recebiam as terras, os índios acabavam sendo expulsos. “Nesse período houve uma grande chacina de índios. Isso aconteceu entre 1938 e a década de 1970. Eram 50 mil índios nesse território e hoje existe pouco mais de três mil índios na região sul”, explica. Wilson ainda comenta que, em 1926, houve uma primeira tentativa de demarcar os 54.100 hectares como território indígena, mas acabou sendo barrado pelos fazendeiros que dominavam a região cacaueira na época.
Ele também relata que, na década de 1970, já não havia índios na região e apenas oito famílias indígenas conseguiram continuar morando em aldeia na região de Itaju do Colônia. Nessa época, vários líderes indígenas se reuniram e formaram uma comissão, que foi até algumas capitais brasileiras, entre elas, Salvador, Rio de Janeiro e Brasília, para reivindicar às autoridades a posse das terras que ficam no “Território Indígena Catarina Paraguassu”, informou Wilson Souza.
De acordo com o coordenador, em 1976, três anos após a criação da Funai, a antropóloga Maria Hilda Baqueiro Paraíso, da UFBA, produziu um relatório identificando os índios que moravam ou trabalhavam na região e, a partir do trabalho, a Funai, em 1982, reúne os índios que estavam dispersos em uma fazenda chamada São Lucas, área de 1079 hectares, e reembolsou o fazendeiro que estava na terra, área que já havia sido demarcada como território indígena. “A Funai achou que seria rápido o processo de reintegração e ingressou com uma ação de nulidade dos títulos que estavam dentro dos 54.100 hectares junto ao Supremo Tribunal Federal. A partir daí inicia a luta pelas terras e os Índios aguardam uma determinação judicial”.

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