domingo, 5 de setembro de 2021

O menino da Vila Zara Vl

O menino da Vila Zara Vl

- Histórias de Infância                                                                                                                                                                 *Joselito dos Reis

*Joselito dos Reis
 O menino da Vila Zara que gostava de fazer muitas estripulias, inclusive, fazendo cobra de cintros, para enganar as pessoas, quando elas passavam pela rua, ele puxava, amarrado o cinto, a uma linha de náilon; as pessoas tomavam grandes sustos!   Também gostava de fazer “pau de bosta! Simulava uma briga, quando alguém mandava um dos dois soltar o pau, ai ele pedia para alguém segurar o pau. Surpresa, o curioso ficava com a mão tolada de “cocô”. Resultado eles davam no pé...!       Era um menino danado, e cheio de criatividade.  Irrequieto, não queria saber de casa, um só minuto! Mesmo quando não tinha os afazeres domésticos. Pois a sua mãe, dividia muitas tarefas de casa com ele.   Entre elas a de lavar os pratos e enxuga-los. O que, o fazia ficar muito chateado. Ele não gostava; “não quero ser mariquinha! ”, pensava. O menino da Vila Zara gostava mesmo de fazer, era de ajudar o Pai na Feira Livre, tanto na feira do bairro da Conceição, que ficava na cabeceira da ponte Lacerda, aos domingos, ou a da Praça José Bastos, centro de Itabuna, onde hoje fica localizada a FTC, que já foi um dia a Prefeitura Municipal, construída pelo então prefeito José Oduque Teixeira. Porque naquela época, anos 60, existia a “Maria Fumaça” e, ele gostava de pegar ponga, mesmo com o risco do maquinista o pegar e puni-lo.   Outra diversão do menino da Vila Zara, era o de “fazer cozido” na Ilha do Mutucugê! Lá pelos lados do “o lavador de carro”, de “Mundinho! ”. Lavador que tinha como chefe “Zé Domingos” seu amigo e, que era um tipo de administrador do local. Um homem, que gostava muita pimenta malagueta no sarapatel e não gostava de levar desaforo para casa, sempre arrumava uma briga e era bom de socos!
Rio Cachoeira, espuma da poluição. Ilha do Mutucugê! 

Resolvendo fazer mais um cozido, o menino da Vila Zara, começou a convidar os amiguinhos e exigindo deles, o que levariam para o almoço da Ilha Mutucugê.  Geralmente o cozido, com cada uma levando os ingredientes, que pegavam em suas casas escondidos dos pais. O evento, uma grande formula de lazer, geralmente acontecia aos domingos.  De “Zé Pequeno” cobrou a jabá e linguiça! De “Nego Tinho”, farinha e tomate! De “Pé de Cabra” feijão! Dato Babão levava o carvão! E por fim “Almir Doido” levava verduras e os outros temperos.     O menino da Vila Zara reunindo os demais ingredientes, partiam para a Ilha. Lá arrumavam o fogo improvisando, feito de pedras... com panos velhos gravetos e papelão acendiam o fogo. Enquanto o menino da Vila Zara, fervia e fazia o tempero da comida!  Local bem aprazível, entre árvores e com a presença de alguns animais. Muita araçá e maracujá ferro! As sombras das árvores davam um toque todo especial e conforto. Local aconchegante. A comida no fogo começa a cheirar... logo cozida, se tornava numa deliciosa feijoada. Feita a tempero doido! Levada ao molho de pimenta, que dava um aroma todo especial, o menino da Vila Zara, se deliciava, frisando que a comida estava com gosto de quero mais! Todos caíam na risada e ele não gostava, e mandava todo mundo ir tomar... banho, no rio! O rio na época tinha grandes corredeiras e uma água cristalina, que se via os peixes nadando sob o seu leito. Depois do almoço o menino da Vila Zara e seus colegas passavam a tarde todinha pescando de mão e de ferrão nas locas pegavam pitus, curucas, acaris (cascudo) e calambaus. Fartos naquela época. Época do carvão, de água no carote e do querosene. Com “Junça”, uma planta típica das margens do rio Cachoeira, utilizavam para fazer “as enfieiras”, que enchiam de peixes e crustáceos. O rio, era farto em peixe, e em abundância.  A contrário de hoje, com todas as suas espécies extintas! Na época o tilápia e o bagre africano. Dois predadores que acabam com todas as demais espécies, eram desconhecidos. Chegaram ao rio, nos anos 90 para cá.  

O menino da Vila Zara, que não gostava de peixe, só pescava para agradar a sua mãe, para quando chegar mais tarde em casa, não tomar uma surra de “bainha de facão! ”.  Pois a sua mãe, gostava muito de Acari (cascudo) para fazer moqueca. Ele esperto, sabia agradá-la. Sua mãe fazia uma deliciosa moqueca a base de quentão e depois a comia com pirão escaldado, levado a pimenta verdinha tirada na hora do quintal da casa.

A Ilha de Mutucugê, mesmo perdendo a sua beleza, as suas árvores e animais, não é mais como antigamente! Não tem árvore; não tem mais animais; peixes, cistáceos e água límpida, onde se pescava também em fartura piabas e “maçambés” um tipo de piaba menor que dava aos milhares, imensos cardumes e que servia como um delicioso tira-gostos para quem adora uma cervejinha! O que não era o caso do menino da Vila Zara na época, com dez anos de idade. De lá para cá, o Rio Cachoeira deu lugar aos esgotos sanitários da cidade, com o seu progresso desorganizado e, sem nenhuma base ou projeto para a manutenção do Rio; o maior patrimônio natural da cidade e da região por onde ´passa. Com isso, o lavador de carros, também deixou de existir. Local onde o menino da Vila Zara, também, nas horas vagas trabalhava e quando chegava em casa, apanhava com “bainha de facão” porque o pai dele não queria, pois, o lavador tinha a fama de concentrar arruaceiros. O mesmo acontecia quando o menino da Vila Zara, ia jogar uma “pelada” ou um “baba”, ou seja, correr atrás da bola! Ao contrário de hoje, quando os pais incentivam aos filhos pela prática do futebol.   

Muitos anos, em São Paulo, de retorno a esta cidade, após 50 anos, o menino da Vila Zara, a passeio, veio rever os amigos e parentes. Hoje como um grande empresário, foi logo visitar a Ilha do Mutucugê, e perguntando pelo “curtume de Bizunga”, que se localizava abaixo, um pouco, da Ilha, e da Fazendo Progresso. Locais esses, onde viveu parte de sua infância e, que ele, gostava de fazer estripulias... colhendo jacas, goiabas, araçás,  cajá e laranja, além da “remela de gato” que deixava todo mundo de “língua azul” quando crianças, ao comtemplar o cenário, sem o lavador de carros, a Ilha e o rio quase destruídos, exalando uma fedentina insuportável, os seus olhos encheram-se de lágrimas, não acreditando no que via!...

Obs:  Algum caso parecido, são meras coincidências

 **Joselito dos Reis Santos

Poeta e jornalista

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