O menino da
Vila Zara Vl
- Histórias de Infância *Joselito dos Reis
*Joselito dos Reis |
Rio Cachoeira, espuma da poluição. Ilha do Mutucugê! |
Resolvendo
fazer mais um cozido, o menino da Vila Zara, começou a convidar os amiguinhos e
exigindo deles, o que levariam para o almoço da Ilha Mutucugê. Geralmente o cozido, com cada uma levando os ingredientes,
que pegavam em suas casas escondidos dos pais. O evento, uma grande formula de
lazer, geralmente acontecia aos domingos. De “Zé Pequeno” cobrou a jabá e linguiça! De “Nego
Tinho”, farinha e tomate! De “Pé de Cabra” feijão! Dato Babão levava o carvão!
E por fim “Almir Doido” levava verduras e os outros temperos. O menino da Vila Zara reunindo os demais
ingredientes, partiam para a Ilha. Lá arrumavam o fogo improvisando, feito de
pedras... com panos velhos gravetos e papelão acendiam o fogo. Enquanto o
menino da Vila Zara, fervia e fazia o tempero da comida! Local bem aprazível, entre árvores e com a
presença de alguns animais. Muita araçá e maracujá ferro! As sombras das
árvores davam um toque todo especial e conforto. Local aconchegante. A comida no
fogo começa a cheirar... logo cozida, se tornava numa deliciosa feijoada. Feita
a tempero doido! Levada ao molho de pimenta, que dava um aroma todo especial, o
menino da Vila Zara, se deliciava, frisando que a comida estava com gosto de
quero mais! Todos caíam na risada e ele não gostava, e mandava todo mundo ir
tomar... banho, no rio! O rio na época tinha grandes corredeiras e uma água
cristalina, que se via os peixes nadando sob o seu leito. Depois do almoço o
menino da Vila Zara e seus colegas passavam a tarde todinha pescando de mão e
de ferrão nas locas pegavam pitus, curucas, acaris (cascudo) e calambaus.
Fartos naquela época. Época do carvão, de água no carote e do querosene. Com
“Junça”, uma planta típica das margens do rio Cachoeira, utilizavam para fazer “as
enfieiras”, que enchiam de peixes e crustáceos. O rio, era farto em peixe, e em
abundância. A contrário de hoje, com
todas as suas espécies extintas! Na época o tilápia e o bagre africano. Dois
predadores que acabam com todas as demais espécies, eram desconhecidos. Chegaram
ao rio, nos anos 90 para cá.
O menino da
Vila Zara, que não gostava de peixe, só pescava para agradar a sua mãe, para quando
chegar mais tarde em casa, não tomar uma surra de “bainha de facão! ”. Pois a sua mãe, gostava muito de Acari
(cascudo) para fazer moqueca. Ele esperto, sabia agradá-la. Sua mãe fazia uma deliciosa
moqueca a base de quentão e depois a comia com pirão escaldado, levado a
pimenta verdinha tirada na hora do quintal da casa.
A Ilha de
Mutucugê, mesmo perdendo a sua beleza, as suas árvores e animais, não é mais
como antigamente! Não tem árvore; não tem mais animais; peixes, cistáceos e
água límpida, onde se pescava também em fartura piabas e “maçambés” um tipo de
piaba menor que dava aos milhares, imensos cardumes e que servia como um delicioso
tira-gostos para quem adora uma cervejinha! O que não era o caso do menino da
Vila Zara na época, com dez anos de idade. De lá para cá, o Rio Cachoeira deu
lugar aos esgotos sanitários da cidade, com o seu progresso desorganizado e,
sem nenhuma base ou projeto para a manutenção do Rio; o maior patrimônio natural
da cidade e da região por onde ´passa. Com isso, o lavador de carros, também
deixou de existir. Local onde o menino da Vila Zara, também, nas horas vagas trabalhava
e quando chegava em casa, apanhava com “bainha de facão” porque o pai dele não
queria, pois, o lavador tinha a fama de concentrar arruaceiros. O mesmo acontecia
quando o menino da Vila Zara, ia jogar uma “pelada” ou um “baba”, ou seja,
correr atrás da bola! Ao contrário de hoje, quando os pais incentivam aos
filhos pela prática do futebol.
Muitos anos,
em São Paulo, de retorno a esta cidade, após 50 anos, o menino da Vila Zara, a
passeio, veio rever os amigos e parentes. Hoje como um grande empresário, foi
logo visitar a Ilha do Mutucugê, e perguntando pelo “curtume de Bizunga”, que
se localizava abaixo, um pouco, da Ilha, e da Fazendo Progresso. Locais esses,
onde viveu parte de sua infância e, que ele, gostava de fazer estripulias...
colhendo jacas, goiabas, araçás, cajá e
laranja, além da “remela de gato” que deixava todo mundo de “língua azul” quando
crianças, ao comtemplar o cenário, sem o lavador de carros, a Ilha e o rio
quase destruídos, exalando uma fedentina insuportável, os seus olhos
encheram-se de lágrimas, não acreditando no que via!...
Poeta e
jornalista
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