Justiça baiana desabriga agricultores de 340 mil hectares em plena colheita
O clima é de tensão e revolta entre os agricultores instalados em áreas do Matopiba (região agrícola que abrange os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) após uma liminar deferida pelo juiz do município de Formosa do Rio Preto (BA), Sérgio Humberto de Quadros Sampaio, que tenta retirar agricultores de uma área de 340 mil hectares, em plena fase de colheita, passando a área para as mãos de uma única pessoa física.
A decisão de reintegração de posse em favor de José Valter Dias escancara mais um capítulo da instabilidade jurídica em relação à posse das terras na região, mas que desta vez, pode prejudicar terceiros de boa-fé, agricultores que tiram daquelas áreas o seu sustento, atingindo também toda a economia do oeste da Bahia, que depende diretamente do agronegócio.
Além de desabrigar agricultores que já fizeram sucessores legítimos, esta decisão judicial transforma Dias no maior latifundiário do Brasil. Esta é a segunda decisão de reintegração de posse do juiz da comarca de Formosa do Rio Preto em favor de Dias. A primeira aconteceu em 19 de setembro do ano passado, quando o juiz assinou uma portaria administrativa para retirar os agricultores das terras que compraram de boa fé, com os devidos registros no Cartório de Registro de Imóveis, há aproximadamente 30 anos.
Ante uma derrota no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em novembro de 2016, que se manifestou favoravelmente à manutenção dos agricultores e empreendimentos agrícolas lá instalados, o juiz recuou e anulou a própria decisão. Segundo a decisão do Conselho, naquele ato, ficaram expostas as irregularidades da decisão que violou o contraditório e ampla defesa, sem ouvir nenhum dos representantes dos produtores antes da reintegração de posse. O CNJ também declarou a ilegalidade de reintegração de posse por medida administrativa e reconheceu a boa-fé dos produtores.
“O que está em pauta neste processo não é o tema de grilagem, não se está discutindo regularização fundiária, o que há, nesta região, são inúmeros, centenas de produtores rurais de boa fé e trabalhadores que há anos desenvolvem suas atividades de forma íntegra e que adquiriram regularmente suas propriedades, com o aval do Estado. Esses produtores não podem ser confundidos com pessoas que podem ter agido ilegalmente para obter outras áreas de terras naquela região”, esclarece o advogado Leonardo Lamachia, que vem defendendo os produtores rurais e suas terras.
Agora, a nova proposta de reintegração dos mais de 300 mil hectares pode desabrigar famílias de suas terras e dizimar com 250 mil hectares plantados de milho, soja e algodão, que deixarão de ser colhidos e comercializados. O reflexo disso terá danos econômicos e sociais gigantescos ao desestabilizar a economia da região e da Bahia, derrubando a cadeia do agronegócio e cedendo milhares de hectares de terras produtivas e em fase de colheita em favor de uma só pessoa física sem nenhum envolvimento com negócio em questão e jamais teve registro como produtor rural na CNA ou em qualquer órgão ligado a agricultura e pecuária, segundo a Aprochama.
A região abriga ainda três multinacionais – a Bunge, a Cargill e a Amaggi/Dreyfus, além da Cosan – uma das maiores empresas do Brasil com investimentos em agronegócio, distribuição de combustíveis e de gás natural, lubrificantes e logísticas – que, assim como os produtores, acreditaram no potencial da região e ali adquiriram terras para exercer as atividades. Um total de 340 mil hectares compõe a área em discussão, destes, 251,5 mil hectares em plena produção principalmente nas micro regiões da Aprochama, Coaceral, Novo Horizonte e Sul Colonização, todas em Formosa do Rio Preto.
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