terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Parte de minha infância: “Lá vem a Maria Fumaça...”


Parte de minha infância:

“Lá vem a Maria Fumaça...”

No início dos anos 60, época em que cheguei a Itabuna, procedente da cidade de Ibicaraí, com apenas seis anos de idade, ficava encantado vendo a “Maria Fumaça” ou “Trem de Ferro”, passar para lá, passar pra cá, vice e versa da cidade de Ilhéus. A sua garagem, localizava-se onde hoje tem o edifício Vila Rica, junto funcionava um depósito de madeira e, ao lado, a grande Feira-Livre, onde hoje está instalada a FTC e onde também funcionou o Centro Administrativo, construído no início dos anos 70, pelo então prefeito, o empresário José Oduque Teixeira. Hoje, depois de tantos anos já passados, parece que em minhas lembranças de criança, estou sonhando com aquele meio de transporte que tanto me encantou e  achava deslumbrante. Circulando, soltando a fumaça no ar, com o seu motor a vapor, queimando lenha da Mata Atlântica, mas sem danos à Natureza. Com os trilhos cortando as lindas fazendas de cacau, os nossos  valorizados  “frutos de ouro” e que fez esta região do sul da Bahia, uma das mais rica do Brasil. Itabuna ou Ilhéus, com seus coronéis estavam embaladas para um grande progresso, que foi interrompido pela Vassoura de Bruxa, uma terrível doença  do cacau e trazida pela mão humana, segundo a perícia da Polícia Federal e, hoje, o processo “dorme em berço esplêndido...”.  Além do povo, a mística “Maria Fumaça” também transportava os nossos produtos: cacau, banana, jaca, etc.  E, mais uma vez, lá vem a “o trem”, cheia de gente para a Feira-Livre, com o seu magnífico som, por cima dos trilhos... que  a gente cantava assim: “café com pão/ bolacha não/café com pão/bolacha não...!”. Muito engraçado, mas levando e trazendo o progresso para esta cidade.  
A Maria Fumaça hoje se encontra assim
no depósito de um Ferro Velho
em Ilhéus


A “Maria Fumaça” tinha como ponto de partida, a cidade de Ilhéus passando por Ubaitaba, Uruçuca, Itajuípe, Banco do Pedro (distrito de Ilhéus), Mutuns (distrito de Itabuna), onde se localizava uma Estação e que foi jogada ao chão recentemente, até chegar a nossa Itabuna. No entanto, o projeto era que o transporte, ou seja, a “Maria Fumaça” chegasse até a cidade de Vitória da Conquista, o que ficou para depois e nunca aconteceu...

No espaço, onde hoje fica localizada a Igreja de São Judas Tadeu, na Avenida Ilhéus, em Itabuna, funcionava o triângulo. Local este onde o “Trem de Ferro”, fazia a volta para estacionar na sua garagem ou prosseguir viagem. A Avenida Ilhéus, naquela época, era conhecida como a Rua da Linha, onde tinha uma intensa movimentação, principalmente, na localidade das sedes da Receita Federal, que já foi uma praça para instalação de Parques e Circos, depois CCPC/CNPC (Conselho dos produtores de cacau) e a do INSS, que tinha no local várias bancas comercializando peixe e crustáceos, tendo ao lado um grande brejo, onde  foi construído o prédio do senhor Juca Sobrinho, pai do nosso saudoso jornalista Eduardo Anunciação.

Eu, como criança, ficava admirado,  trepado no muro da Feira-Livre (muro que separava a Feira dos trilhos da “Maria Fumaça”), a apreciar a sua chegada, muitas vezes levando “bronca” do meu pai, que era um dos feirantes, (comercializava cereais, inclusive, a tradicional “farinha de Buerarema), porque deixava o serviço, para olhar a chegada ou saída do “Trem”. Era um grande movimento do povo que chegava e saia da cidade... Movimento que eu achava muito engraçado, pois ao lado do muro, bem em frente a Praça José Bastos, se localizava a Estação de Passageiro. Local que o poeta cordelista Minervino Silva, vendia seus livretos, contando estórias de “Pedro Malazart e Cancão de Fogo”, “Lampião e Maria Bonita”, “A Mulher de Sete Metros” e outros títulos, tendo ao seu lado um Peixe Elétricos,  in-loco, vendendo o seu olho – segundo o poeta – para combater o reumatismo.  Com gente de todas as paragens, este local mais tarde, com a extinção da linha de ferro, foi instalada  uma escola de corte/costura e datilografia. Dai surgiu o colégio CISO, através do professor Josué Bandão.  

A minha curiosidade era a de embarcar na “Maria Fumaça!”. Como não tive a chance, resolvi pegar uma ponga. Só que o maquinista me prendeu, e me soltou, mais ou menos onde fica  o bairro São Roque  (Caixa D Água). Lá vem eu de volta e preocupado, porque sabia que ia levar uma bronca de meu pai. Não levei bronca, não! Levei foi uma surra de corda! Que raiva! E pensava... “aquele maquinista vai me pagar!”. Para isso, reunir meus amiguinhos de infância  do Bairro Vila Zara, e ficamos a esperar a “Maria Fumaça” passar, bem naquele morro enfrente a pequena rotatória da Baby Clínica. Todos meus amiguinhos com uma pedra na mão... De repente, lá vem a “Maria Fumaça” jogando fumaça no ar e o perverso maquinista bem na gabine da frente. Nos preparamos e arremessamos as pedras. Uma acertou bem a cabeça do maquinista que se contorceu em dores e corremos; “pernas pra que te quero”. Foi a minha vingança...

Final da linha...  
A nossa história conta que a linha tronco, Ilhéus/Itabuna, foi aberta em 1910, em seu primeiro trecho por investidores ingleses da The State Of Bahia South Western Railway Company Limited e por se tornar decadente em 1964, foi desativada através da ordem da RI-49 e Rede Ferroviária Federal-RFFSA.

A “Maria Fumaça” ainda por alguns anos ajudou na construção do Porto de Ilhéus, transportando pedras,  ficando exposta, depois nas imediações da Praça do Cacau. Servia como atração turística. O seu destino, depois de tantos serviços e história foi um “Ferro Velho”, conforme mostra a foto. Passou a ser sucata. Se ainda estivesse em evidência, com certeza, seria hoje uma grande atração turística, para todos que visitam a Costa do Cacau.       

Joselito dos Reis
Poeta e Jornalista
28.01.2020.

                   





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