Júlio César |
Para
os cristãos, o romano Poncio Pilatos, governador civil e comandante das tropas
romanas estacionadas na Judeia ao tempo da crucificação de Jesus é, sem dúvida,
o grande algoz do Mestre Salvador, pois foi aquele que decretou-lhe a morte e
executou a sentença.
A
visão acima não está incorreta, já que a História a confirma. Entretanto, se
prestarmos mais atenção aos acontecimentos que antecederam à execução de Jesus,
poderemos perceber de forma muito mais rica e humana a atuação de Pilatos neste
episódio. Vejamos.
Após
ser traído por Judas, Jesus foi preso e conduzido, à presença do principais
sacerdotes judeus e, em seguida ao Governador da Judeia, ou seja, a Poncio
Pilatos. Este, no entanto, não tendo encontrado nenhum motivo para submetê-lo
às duríssimas penas do Direito daquela época, o remeteu de volta aos príncipes
Judeus, na pessoa de Herodes (Lucas, 23:07), de forma a tirar a si próprio e ao
Governo Romano daquilo que entendia ser uma disputa entre Judeus relacionada às
suas questões religiosas e políticas, já que os judeus não separavam política
de religião. Assim, Pilatos tentou abster-se de condenar alguém que tinha por
inocente, pois se assim não fosse teria sentenciado Jesus naquela primeira
ocasião (Lucas, 23:04).
Ao
retornar para as autoridades judaicas, Jesus é levado à presença de Herodes,
por quem é interrogado e onde é novamente espancado, saindo de lá para ser
levado de volta a Pilatos, sob acusação de dizer-se rei dos Judeus e, portanto,
um perigo fatal para a ordem e a dominação exercida pelo Império Romano.
Diz-nos
a bíblia, no entanto, que a esposa de Pilatos tivera um sonho com Jesus e, a
partir de tal fato, suplicou com toda a veemência para que seu marido nada de
mal fizesse àquele Jesus (Mateus, 27:19).
Pode-se
depreender seguramente, sobretudo a partir de quando Pilatos recebe Jesus pela
segunda vez, que o governador romano, de fato, tudo fez para tentar impedir a
condenação e execução de Jesus. Preste atenção:
Sem
opção ante o pedido de execução feito pelos mais importantes líderes judeus,
Pilatos tenta uma manobra política para tentar obter a não aplicação da pena de
morte imputada a Jesus, colocando-o com apenas mais um outro acusado para que
um deles pudesse ser beneficiado com o perdão e a soltura, em virtude de antigo
costume existente de, na Páscoa, indultar um acusado condenado à morte.
Para
suprema decepção de Pilatos, o povo daquela época, incitado pelos fariseus,
doutores da lei e sacerdotes, prefere Barrabás a Jesus, pedindo o perdão da
pena de morte em favor tão-somente de Barrabás (Lucas, 23:20-21).
Completamente
desesperado, Poncio Pilatos pergunta – por nada menos de três vezes seguidas (Lucas,
23:22) – o que fazer com Jesus, ao que o povo responde aos gritos: Crucifica-o!
(Mateus, 27:22-23; Marcos 15:14)
Pilatos
sabia que os judeus, em virtude de suas convicções religiosas, entendiam ser a
dominação romana uma afronta ao seu Deus e à sua religião, e que por isso
estavam sempre pronto a sublevar-se, assentando-se a dominação romana, nesta
situação, unicamente na eficácia da ação militar de seu disciplinado Exército.
Entretanto,
Pilatos dispunha somente de uma tropa com algumas centenas de soldados, que
dificilmente conteriam um levante de uma cidade com algo em torno de 30 mil
pessoas, que era como Jerusalém deveria encontrar-se durante os festejos
pascais.
Lembremos,
por fim, que com Pilatos estavam sua esposa e, por óbvio, filhos, pelo que um
levante judeu bem sucedido ceifaria não só a vida do governador, mas de toda sua
família.
A
este homem, decerto frio e calculista; porém também certamente tocado pelos
inexplicáveis sentimentos de amor e temor que aquele singularíssimo acusado lhe
provocava, não restou saída senão lavar as mãos em público do sangue daquele
inocente, fazendo-o da forma mais explícita possível, marcando a história da humanidade.
Penso
ser oportuno esta visão do Pilatos homem, do Pilatos esposo, do Pilatos pai de
família, cheio de medo, amargura, frustração e impotência, ante o ódio imenso do
mundo.
Decerto
que Pilatos sucumbiu aos interesses mundanos ao permitir – na prática, sem alternativas
– à crucificação de Jesus. Condenou-o, dando cumprimento às profecias, ao que
estava escrito e que ele talvez jamais pudesse mudar.
Porém,
talvez tenha mudado a sua própria história, diante do condenado de nome Jesus.
Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e em Direito pela UESC – Universidade Estadual de
Santa Cruz. e-mail: juliogomesartigos@gmail.com
Permitida
a reprodução total ou parcial, desde que citada a autoria.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seja responsável